sexta-feira, 28 de maio de 2010

ENTREVISTA COM SOCIALITE

Em ano eleitoral, este O Paredão resolveu olhar para uma personagem que nem sempre faz parte do debate político: a mulher do financiador de campanha. Uma popular socialite, casada há quase 35 anos com uma das dez maiores fortunas do Corredor da Vitória, aceitou falar com nossa reportagem. A condição estabelecida foi o anonimato. O teor corrosivo das respostas justifica a preservação de identidade, que será respeitada (até mesmo porque ainda pleiteamos uma verba de publicidade de alguma empresa de menor porte registrada pelo cônjuge). Basta saber que ela é discreta nas altas rodas, mesmo que o cabelos claros cor de gema fulgurem chamando atenção nos eventos.
imagem meramente ilustrativa

O COBRADOR - A senhora sempre mantém uma postura afastada de polêmicas e opiniões partidárias (mesmo com todos sabendo que seu marido é dos principais patrocinadores dos governos nas últimas quatro décadas). Por que agora resolveu explicitar seus pensamentos?
SOCIALITE ANÔNIMA - É como dizem na academia: a panturrilha só se evidencia depois de fortalecer o tornozelo e todos os ligamentos estarem aptos ao esforço. É aquela coisa da combinação certa entre alongar e contrair. Depois de um tempo de maturação, as ideias florescem. Por isso que minha nutricionista sempre diz que a digestão só termina depois da obstipação, ou seja, é preciso colocar pra fora.

OC - Então, por essa lógica, é possível dizer que a senhora ficou durante tanto tempo intelectualmente constipada?
SA - Acho que talvez você tenha entendido errado. Meu intestino é ótimo. Dizem que Tag Heuer e Swatch são os melhores relógios do mundo, mas eu confio ainda mais em meu reloginho biológico

OC - Tudo bem, entendemos. Então, o que a senhora acha de governos de esquerda no poder?
SA - Eu discordo de meu marido quando ele diz que toda ideologia vale 10% a 15% de uma obra. Acho que os governos de hoje fazem coisas boas. Veja aí essa ideia do Bolsa Família. Você sabe o que é uma mãe ter cinco filhos e só conseguir colocar cachorro-quente para eles? Eu sei, porque uma vez visitei uma comunidade lá no Imbuí que é atendida por um projeto de meu grupo de pós-graduação em Estética do Urbanismo Capital. Minhas colegas não prestaram atenção, mas eu vi que a mãe estava servindo cachorro-quente para as crianças. Você sabe que praticamente não tem proteína naquelas salsichas, não é? Pois se aquela senhora tivesse o Bolsa Família poderia servir sempre peixinho grelhado com suco de fruta, ou raízes orgânicas no café da manhã. Tudo isso é ótimo para o desenvolvimento das crianças.

OC - Estou surpreso com o conhecimento da senhora sobre realidades de famílias carentes. Agora, uma questão que nunca foi cogitada: socialites também fazem campanha?
SA - Sua pergunta é ótima. Sabia que duas eleições atrás eu descobri aquela coisa maravilhosa que é boca-de-urna? Eu sempre voto no (Clube) Bahiano (de Tênis), no fim da tarde, mas naquela vez a gente precisava sair cedo para pegar o iate. Aí vi a empolgação da boca-de-urna. Na mesma hora, peguei meu iPhone e comecei a mandar SMS e emails para as amigas. Acho que consegui muitos votos para minha deputada.

OC - E quem era essa sortuda?
SA - Uma jovem muito inteligente que sempre frequentava o mesmo legpress que eu na academia. Ela se empenhou bastante e na época da campanha diminuiu s malhação para só duas vezes por semana. Faltou muito pouco para ganhar, o que foi uma pena. Ela tinha um excelente projeto de disponibilizar personal trainer para mães, em licença-maternidade, pelo SUS.

OC - Interessante, mas além desse momento de boca-de-urna vocês fazem política em outras horas?
SA - Claro. A política, como disse Platão, é a arte da dialética aplicada ao cotidiano de luz e sombra da caverna - ou algo parecido com isso. Então, acho que toda atitude nossa é política com P maiúsculo. Se vamos na Victor Hugo e compramos aquela bolsa de couro maravilhosa com a alça toda em madrepérola e está numa pechincha de uns R$3 mil, isso é um ato político. E ao mesmo tempo se você aproveita para doar aquela bolsa antiga da Arezzo para a sua empregada de Cajazeiras você está fazendo algo tão simbólico como um comício.

OC - Como assim?
SA - É isso que eu chamo de justiça social.