sábado, 22 de janeiro de 2011

Diálogos com Azeda

Nesta segunda-feira (17/01), este O Cobrador da Silva pôde manter um papo em alto nível sobre a cultura na Bahia. Esta que é considerada a segunda maior tragédia nacional (só perdendo para o drama de suor, barro e lágrimas na Região Serrana do Rio de Janeiro) continua com representantes tentando insistentemente serem chamados de artistas, quando, a depender dos estragos que provoquem, o máximo de "istas" que poderiam ganhar seria terroristas.
Evidentemente que esse assunto é longo como um "bom dia" de um Testemunha de Jeová e não cabe no espaço de um post e nem em um buzu Barra/Estação Pirajá às seis horas da tarde. Como eu dizia, pude conversar civilizadamente com uma jornalista sativa, quero dizer, nativa, a respeito da peça Quem Matou Maria Helena.
Provavelmente, assistimos a mesma sessão de estreia no teatro Sesc Casa do Comércio. Certamente, fui depois de receber convites de um patrocinador que este O Cobrador acharca constantemente com notinhas mais venenosas do que a marmita que o ex-Geddel faria pra João Henrique, caso aceitasse a sugestão de cozinhar pra fora. Ela, a repórter e crítica Eduarda Azeda, dada a imparcialidade e frieza com que tratou sobre a produção artística, deve ter pago os 40 reais de ingresso.
Nosso diálogo foi pouco ortodoxo. Ela resumiu suas frases em 25 linhas de texto no jornal e eu respondii como bem entendi:

Azeda - O espetáculo Quem Matou Maria Helena?, que traz o ator Frank Menezes vivendo múltiplos personagens, é garantia de muita diversão nas noites de quinta e sexta-feiras.
OCobrador - Porra, Azeda. Você conversa assim com todo mundo? Que frase mais formal para um início de diálogo. Parece até que você está iniciando um texto de jornal. Um texto que fosse ruim, por sinal.

Azeda - Pois é. O intéprete esbanja talento e versatilidade em intricada trama policial (e põe intricada nisso!), que traz ingredientes de folhetins novelescos.
OCobrador - Rapaz, toda vez que usei a palavra intricada em uma conversa eu quis falar sobre algo sem nexo.

Azeda - O texto de Cláudio Simões utiliza os clichês do gênero com muita imaginação. Tudo muito bem amarrado e justificado que, apesar das situações inverossímeis (e é isso que dá graça ao enredo), o público compra a ideia e adora.
OCobrador - Ah, Azeda, a gente estava falando sobre a peça. Complementando o que você estava dizendo, a história da peça tem tantas pontas soltas que parece mais o cabelo da Chiquinha do Chaves. Mas você que entende de arte cênica, não está mais aqui quem falou...

Azeda - A peça traz direção limpa e competente de Celso Jr., que explora o melhorde Frank Menezes, que vive vários personagens, sem recursos de caracterização.
OCobrador - Azeda, ainda bem que você acompanhou os ensaios para perceber o que Celso explora de melhor...

Azeda - Utilizando apenas as expressões facial e corporal, Frank dá vida aos personagens de uma mesma família envolvidos em suspeita de um crime bárbaro.
OCobrador - Bem lembrado, Azeda. Dado o momento atual do teatro, onde atores costumam usar apresentações do powerpoint, vídeos de pastores da Universal em 3D e até tubaína Fryllar pra dar vida aos personagens, é de impressionar que ele tenha usado apenas expressão facial e corporal. Se ele não fosse tão bom, poderia ter usado também, também, também... ah, agora esqueci o que atores de teatro usam mais para protagonizar uma peça.

Azeda - E Celso acerta em não resvalar para o humor grosseiro ou o besteirol sem consistência.
OCobrador - Ah, que pena que a gente não deve ter assistido a mesma sessão. Pois na noite que fui parece que o público deu mais risada quando ele fez uma careta imitando a "expressão facial" da morta. Ou quando Frank se arrasta de costas pelo chão. Hum... acho que essas não devem ser as cenas de humor mais, digamos, consistente.

Azeda - É bom o cenário de Márcio Meirelles, que destaca o vermelho como símbolo da paixão e crime.
OCobrador - Ah, Azeda, depois que você anda frequentando aquela escola de cromoterapia está toda por dentro dos significados das cores, hein... E ainda conseguiu perceber todo o sentido de um cenário vazio com um quadro atrás. Genial esta economia de elementos.

Azeda - E as galinhas do cenário, de Ivana Columbi, dão graça à trama.
OCobrador - Pô, me desculpe, fiquei com vontade de rir agora. Deve ser pela graça da trama.

Azeda - A peça ainda conta com bons desempenhos para voz em off, dos atores Harildo Déda, Evelin Buchegger, Celso Jr, Nilda Spencer e Wilson Mello.
OCobrador - E precisa ser mesmo ator pra gravar aqueles negócios dos telefonemas? Algumas eu pensei se tratar de Pegadinha do Mução. Mas se você disse que é bom, vou acreditar, porque você entende. Da próxima vez, a gente conversa sobre Big Brother, que é um assunto que eu domino melhor.

Azeda - Todas as quintas e sextas de janeiro...
OCobrador - Valeu, hein, Azeda. Até a próxima.

domingo, 6 de junho de 2010

UM DIA DE DOMINGO

Ah, o domingo! Este dia solene que é útil para o ocioso em serviço. Esta marcação no calendário gregoriano tão bem batizada pelos ingleses como SUNDAY! Ó dia de sublime solar, onde o soberano astro da galáxia ilumina corpos e mentes banhando de claridade e sabedoria a existência cotidiana.
Movido por esse espírito de exortação e plenitude, este O Cobrador decidiu começar o dia comprando uma baguete com manteiga e o jornal A Tarde. Já se iam 13 anos desde que comprara pela última vez um exemplar do ex-mais lido do Norte e Nordeste. Lembro que foi justamente na época em que precisava migrar para um novo cafofo e usei os Populares para encontrar o meu 4 suítes no Horto Florestal, adquirido em parte com o financiamento da Caixa, em parte com o acúmulo de anos de jabá honestamente acharcado.
Inicialmente, como um bom gourmand que sabe extrair do couvert o prenúncio de uma lauta refeição, dediquei-me a deslizar a vista por manchetes, títulos, subtítulos e chamadas, legendas, olhos e eleutrias outras da edição. A ideia era entender o que mobiliza a atenção da grande imprensa como repercutora dos anseios por informação da classe média.

Já sabemos o que norteia a busca por informação deste O Paredão, que é o princípio holístico do jornalismo sistematizado com o 5S: sexo, sangue, sofrimento, Sigmund Freud e saldo bancário positivo custe o que custar.
Pois na rápida visão dá para perceber que os editores da grande imprensa se interessam muito é pelo que viram como destaque no twitter - esse pauteiro gratuito dos ignorantes, que não
cobra por plantão e sugere temas ecléticos e diversificados, como o que Caetano Veloso
respondeu para a sobrinha Preta Gil e o que Deborah Secco vai fazer com o oitavo apartamento que comprou em conjunto com o seu grande e eterno amor da semana passada.

Pois a edição dominical do A Tarde é um amálgama de cultura, informação e pedagogia modernos. A questão da adaptação orgânica ao movimento terrestre de rotação e do chamado relógio biológico é constantemente relativizada pela publicação. Você vai ver abaixo que uma simples notinha de serviço pode virar um verdadeiro libelo contra a imposição de convenções tolas para a contemporaneidade, como horários marcados:

Não percebeu o contundente discurso contra os moralismos tolos? Basta dizer que eu acordei cedo naquele sábado, pouco depois das 10h30, portanto, chegaria a tempo de participar das atividades. Do mesmo jeito que o síndico do meu cafofo de luxo, um aposentado que levanta da cama às 4h30 para fazer a adoração ao deus Rá, também participaria, já que o importante é quem acordou cedo (seja qual for o critério pessoal para isso).
Indo mais adiante, encontrei um grande esforço de reportagem do gênero investigativa-fenomenológica-pirotécnica sobre fabricação de fogos de artifício no São João. Como o tema é criativo e inovador, justifica o tamanho da matéria com uma página de grandes descobertas. A manchete bombástica dá a entender que nem a mulher do prefeito fica alheia ao mercado lucrativo de traques de massa, espadas, chuvinhas e adrianinos:

Centímetros abaixo, uma cifra chama a atenção no famigerado lead: 20 mil pessoas fazem parte desta fabricação.

Então, pela consolidada regra de três simples (aquele processo do X está para tanto, assim como tanto está para tanto), chegamos à conclusão de que a cidade de Cruz das Almas tem 28,5 mil habitantes. Ou seja, Cruz das Almas inteira, com campus da Ufba e tudo, cabe no Engenho Velho de Brotas, ou até mesmo no condomínio Le Parc da Paralela. Se consultassem o grande compêndio estatístico que é a wikipedia (e não mais o IBGE), saberiam que o município não tem menos do que 60 mil habitantes.

Continuando no mesmo princípio da dúvida aritmética, encontramos na capa de esportes outro desafio a Pitágoras. O mundo todo sabe que a Jabulani vai correr na África do Sul no dia 11 de junho. Pelo menos esse é o marketing feito sobre a abertura da Copa. Então, por qual tabuada seria plausível colocar no dia 6 de junho que "faltam 4 dias para o início da Copa"?

Um rápido vislumbre na coluna social e a identificação de uma foto vinda do além (basta continuar seguindo a temível seta vermelha):

O mais anônimo dos paparazzi quer a identidade preservada a todo custo, mesmo que custe o emprego do revisor, ou do editor desatento.

Mas aí, como se a constatação súbita de que aquele guisado de galinha caipira não foi bem recebido pela superfície ciliada do intestino delgado (a saber, você vai cagar mole o dia inteiro), você percebe a construção indigesta, em negrito e em destaque, no meio do texto:

Parece leviano apontar que o superintendente de trânsito é temido a ponto de ordenar uma chacina, mas não há dúvidas. o texto foi lido e relido por mais de uma pessoa com nível universitário, portanto é bom começarem a pedir antecedentes criminais antes de nomear o segundo escalão da prefeitura.

sexta-feira, 28 de maio de 2010

ENTREVISTA COM SOCIALITE

Em ano eleitoral, este O Paredão resolveu olhar para uma personagem que nem sempre faz parte do debate político: a mulher do financiador de campanha. Uma popular socialite, casada há quase 35 anos com uma das dez maiores fortunas do Corredor da Vitória, aceitou falar com nossa reportagem. A condição estabelecida foi o anonimato. O teor corrosivo das respostas justifica a preservação de identidade, que será respeitada (até mesmo porque ainda pleiteamos uma verba de publicidade de alguma empresa de menor porte registrada pelo cônjuge). Basta saber que ela é discreta nas altas rodas, mesmo que o cabelos claros cor de gema fulgurem chamando atenção nos eventos.
imagem meramente ilustrativa

O COBRADOR - A senhora sempre mantém uma postura afastada de polêmicas e opiniões partidárias (mesmo com todos sabendo que seu marido é dos principais patrocinadores dos governos nas últimas quatro décadas). Por que agora resolveu explicitar seus pensamentos?
SOCIALITE ANÔNIMA - É como dizem na academia: a panturrilha só se evidencia depois de fortalecer o tornozelo e todos os ligamentos estarem aptos ao esforço. É aquela coisa da combinação certa entre alongar e contrair. Depois de um tempo de maturação, as ideias florescem. Por isso que minha nutricionista sempre diz que a digestão só termina depois da obstipação, ou seja, é preciso colocar pra fora.

OC - Então, por essa lógica, é possível dizer que a senhora ficou durante tanto tempo intelectualmente constipada?
SA - Acho que talvez você tenha entendido errado. Meu intestino é ótimo. Dizem que Tag Heuer e Swatch são os melhores relógios do mundo, mas eu confio ainda mais em meu reloginho biológico

OC - Tudo bem, entendemos. Então, o que a senhora acha de governos de esquerda no poder?
SA - Eu discordo de meu marido quando ele diz que toda ideologia vale 10% a 15% de uma obra. Acho que os governos de hoje fazem coisas boas. Veja aí essa ideia do Bolsa Família. Você sabe o que é uma mãe ter cinco filhos e só conseguir colocar cachorro-quente para eles? Eu sei, porque uma vez visitei uma comunidade lá no Imbuí que é atendida por um projeto de meu grupo de pós-graduação em Estética do Urbanismo Capital. Minhas colegas não prestaram atenção, mas eu vi que a mãe estava servindo cachorro-quente para as crianças. Você sabe que praticamente não tem proteína naquelas salsichas, não é? Pois se aquela senhora tivesse o Bolsa Família poderia servir sempre peixinho grelhado com suco de fruta, ou raízes orgânicas no café da manhã. Tudo isso é ótimo para o desenvolvimento das crianças.

OC - Estou surpreso com o conhecimento da senhora sobre realidades de famílias carentes. Agora, uma questão que nunca foi cogitada: socialites também fazem campanha?
SA - Sua pergunta é ótima. Sabia que duas eleições atrás eu descobri aquela coisa maravilhosa que é boca-de-urna? Eu sempre voto no (Clube) Bahiano (de Tênis), no fim da tarde, mas naquela vez a gente precisava sair cedo para pegar o iate. Aí vi a empolgação da boca-de-urna. Na mesma hora, peguei meu iPhone e comecei a mandar SMS e emails para as amigas. Acho que consegui muitos votos para minha deputada.

OC - E quem era essa sortuda?
SA - Uma jovem muito inteligente que sempre frequentava o mesmo legpress que eu na academia. Ela se empenhou bastante e na época da campanha diminuiu s malhação para só duas vezes por semana. Faltou muito pouco para ganhar, o que foi uma pena. Ela tinha um excelente projeto de disponibilizar personal trainer para mães, em licença-maternidade, pelo SUS.

OC - Interessante, mas além desse momento de boca-de-urna vocês fazem política em outras horas?
SA - Claro. A política, como disse Platão, é a arte da dialética aplicada ao cotidiano de luz e sombra da caverna - ou algo parecido com isso. Então, acho que toda atitude nossa é política com P maiúsculo. Se vamos na Victor Hugo e compramos aquela bolsa de couro maravilhosa com a alça toda em madrepérola e está numa pechincha de uns R$3 mil, isso é um ato político. E ao mesmo tempo se você aproveita para doar aquela bolsa antiga da Arezzo para a sua empregada de Cajazeiras você está fazendo algo tão simbólico como um comício.

OC - Como assim?
SA - É isso que eu chamo de justiça social.

sábado, 1 de maio de 2010

A MILÉSIMA SEGUNDA NOITE NA LADEIRA DA BARRA

Imagino que qualquer Yacht Club do mundo - se os ricos representam realmente a nata da sociedade - estão na parte que azedou e virou coalhada. Seria de todo ilícito falar em uma podridão da qual nada se aproveita, como é o escarro de um babuíno ou os estertores da digestão de um canguru. Pois no Yacht Clube da Bahia - fundado em 23 de maio de 1935 - a situação é piorada, já que os movéis de carvalho exalam a nostalgia do dinheiro. Funciona como o extrato do pretérito, quando gerações anteriores foram capazes de construir o fausto para sustentar a decadência perfumada de hoje.

Este O Paredão testemunhou um evento noturno no petit comitée da Ladeira da Barra e constatou que definitivamente o nosso colunista do segundo caderno acertou ao prever que a C&A fez bem em contratar Ivete Sangalo como garota-propaganda (não preciso dar maiores detalhes sobre essa constatação, mas podem ver se nas filas da referida loja de departamento neste exato momento não estão serviçais que atendem ao gênero "senhoras-em-vias-de-falência", cuidando para a renovação do guarda-roupa).

A primeira observação do nosso estagiário etílico foi a solidariedade entre os garçons do buffet e os tequileiros. Aqueles pedem a estes para retirar o maior número de itens da bandeja e assim aliviar mãos dos olhos de abutre dos antes-ricos. O peso de equilibrar entrar o sorriso de gentileza mal paga e o desejo que essa raça agonize sem vestígios de pompa.

É sintomático quando uma banda-baile escolhe para o repertório a música Dou a Vida por Um Beijo, de Zezé di Camargo e Luciano ("difícil demais te amar assim..."), antes executada exclusivamente em bares de alcólatras corneados do subúrbio ferroviário. Sinal dos tempos. Se tiver versão acústica, com metais em um arranjo novo, já há o pretexto suficiente para se tornar cult (o nome do brega de quem se julga rico).

A vida de aparências (ou histórias de fazer dormir gente grande), poderia ser um título de um livro psicografado de Clarice Lispector, mas é a sinopse para qualquer convescote da grã-finagem, encontros que se tornaram a antítese do capitalismo. O dinheiro não gira - porque não existe -, tudo é permuta, os serviços são trocados, a comida é distribuída em troca de uso de propaganda, ninguém precisa pagar a ninguém, todas as ararinhas azuis permanecem em extinção e as últimas continuam engaioladas. Doze bolinhos de frango fritos valem uma notinha na coluna social de um informativo para consultórios médicos.

Enquanto isso, pingentes de strass adornam pescoços flácidos que 40 anos antes ostentavam ouro 18 quilates, ex-damas fazem biquinho para beber espumante e garotas de farmácia não seguram o dedo mindinho ao elevar a taça.

O fotógrafo contratado ganha por produtividade, por isso precisa sugerir que o máximo de pessoas sorriam, mesmo que isso implique em fisionomais mais artificiais do que os muitos seios do salão. Alguns whiskies de 8 anos são sorvidos com a cerimônia de maltes escoceses, enquanto o espumante travoso de umbu-cajá é nacional mesmo. Mudam-se os tempos, mudam-se as exigências de paladares.

Os preparadores de coquetel, que recentemente passaram na segunda fase de alguma matrícula em formato vestibular, continuam tratados pelos garçons como se fossem acompanhados dos respectivos avatares, só isso para explicar porque são servidos em dobro no fundo do salão. De repente, um deles saca o celular piscante e balança para o colega: "é mulher, viado". Definitivamente, quando fenômenos desse nível reptiliano de evolução encefálica viram assunto de cobertura jornalística é porque a banda continua insistindo no repertório "as melhores já tocadas por quem tem a mãe no mangue".

Rodas de amigas se revezam para tirar fotos em câmeras de 8 a 10 megapixels: individuais (sentadas na banqueta alta), ou coletivas (prendendo a respiração e tentando reduzir medidas abdominais bem disfarçadas em vestidos).

(Nesse momento, todos saíram da frente e minha imagem surge em um espelho do tamanho do pé-direito, de tal sorte que é até difícil o auto-reconhecimento; pensei que estava na festa mas a fotografia é de um homem com o queixo apoiado em uma das mãos, camisa branca, olhando para o nada, expressão semelhante a quem é internado por ingestão de salmonela).

sexta-feira, 19 de março de 2010

FASHION APOCALIPSE

"O fim está próximo": eu sei, também leio releases

Lixo, enxofre, gases putrefatos e muitos corpos sem vida fazem parte do cenário pós-apocalíptico. Poucos sobreviventes irão testemunhar a desgraça derradeira da humanidade. O sol, sem vida e calor, opaco, obnubilado, já não vai ter forças para fomentar a vida. Nesse momento de terror, apreensão, angústia, quatro cavaleiros chegarão ceifando os ímpios de uma dolorosa prorrogação de agonia.

Isso é o que o pastor da criatura que limpa o cubículo de O Paredão - a mesma que iniciou a carreira de diarista fazendo faxina no Coliseu na época de Júlio César - prega em sua mente todos os dias. Eu sou mais pragmático, considero que o fim está próximo mesmo e as evidências estão todas aí. Assessorias de imprensa, mesmo, eu só conheço como emissárias do apocalipse. Se você acha exagero, é só ler o último release que chegou à nossa concorrida redação sobre o lançamento de uma loja de roupas de madame aqui em Salvador:

Coleção
Iniciamos a estação observando as fronteiras permeáveis do universo. Sentimos o pulso contínuo do tempo que direciona o futuro. Sonhamos com um mundo onírico. Sentimos o efêmero, a metamorfose e a aurora com suas cores e brilhos suave, como ninfas que dançam e transformam a atmosfera. Inspiramo-nos na leveza dos movimentos e exuberância da natureza tropical e as riquezas desse planeta único para contemplar a vida, sua multiplicidade. Deslumbramento.
Tudo isso nos conduziu a um estado de graça. Sensibilidade. Quimera.

Depois dessa, só um comentário: acaba, mundo, que do jeito que está aí é pauta demais para O Paredão.
atualizada em 24/03:
depois de um exaustivo trabalho de Mata Hari Krishna, nossa repórter investigativa, descobrimos o site da referida instituição de venda de tecidos para cobrir dondocas:

sábado, 13 de março de 2010

5 contra alguns

"Meu nome é lixo, mas pode me chamar de projeto de tradução intersemiótica"

Pessoas que fumam maconha (aka maconheiros) são privilegiadas nessa vida. Eles sempre são perdoados por tudo (ahhh, são apenas um bando de maconheiros), terminam isentos de imposto de renda, como os cardiopatas crônicos e os transplantados de rins, e ainda formam uma raça de beneficiados pelo programa canabis família. Na prática, maconheiro pode qualquer coisa, sem risco de sanções, admoestações, e o pior, sem autorização para serem atacados com frouxos de risos.

Digo isso motivado pela excursão cultural ao Teatro Vila Velha pra testemunhar a agonia da humanidade rumo a 2012. Neste caso, o capítulo: 5 sobre o mesmo, que começou piadisticamente com o apelido de 5 contra 1 (alusão onanista a algo que não poderíamos prever ser mais insosso que uma punheta) e terminou como 5 contra alguns (os performáticos atacando as glândulas pineais que gerem o bom senso dos 13 espectadores). Chamar aqui de espetáculo de dança é apenas uma colocação benevolente a malcriações de um grupo de pessoas que fumam maconha (aka maconheiros). Do mesmo jeito que você chama de banda aquele barulho crucificante que os colegas de seu filho do sétimo período fazem quando se juntam, microfones de Playstation nas mãos.

No caso daqueles, pessoas de comportamento erudito com catchup e maionese, frases de efeito fast food e propostas cult cream cracker, a ocupação, segundo críticos cremogema, é em "propor uma experiência autônoma e isolada, no qual o espaço e outros recursos cênicos, como a luz, a música e o cenário, por exemplo, só se tornaram conhecidos quatro dias antes da estreia". Como diria Obama, "talk for sleeping cow".

Pois pessoas que fumam maconha (aka maconheiros) nesse momento estão recebendo subvenção pública oficial para pesquisar, experimentar, delinear, coreografar e manipular modalidades de expressões artísticas, mesmo que isso seja o outro nome para imitações de ataques epiléticos, mímicas de treinamentos para comissárias de bordo ou reinterpretações da dança do glu glu de Sérgio mallandro na Oradukapeta. Tudo isso sem que seja cobrada qualquer contrapartida estética, ética, conceitual ou porra nenhuma, nem seja divulgada em edital a verba do orçamento gasta em erva doce para tanto. O pior é que ninguém pode falar nada, nem interromper o lixo com uma tosse ou arrotos poéticos no meio da catarse de lodo humano. Tem que pagar os oito contos e assistir calado para valorizar a cultura baiana.

terça-feira, 26 de janeiro de 2010

PRÉ-SAL, O TESTEMUNHAL OCULTO E QUEM PAGA A CONTA

Este O Cobrador da Silva não costuma muito ouvir rádio por questões de audiometria, mas em determinadas ocasiões digestivas do meu dia deixo os movimentos peristálticos das entranhas serem ninados por alguma frequência modulada. De forma que dia desses meus tímpanos testemunharam uma dessas aberrações da imprensa que parecem tão harmoniosas como uma protése de silicone nas tetas de uma tamanduá-bandeira.
Ouço o famoso âncora de um programa de difamações e lobbys no rádio falando como se quisesse ter uma conversa mais pessoal e franca com a meia dúzia de ouvintes que atendem ainda não pediram para parar o mundo e eles descerem. Ele tem a voz de um vovô da carochinha, como se quisesse contar melhor uma fábula de pescador. O que parece mesmo o prólogo de uma anedota se mostra uma propaganda descarada do Pré-Sal, a título de informação gratuita sobre os benefícios da arrojada iniciativa da Petrobras. Arrojada também é o nome que alguns marqueteiros usaram quando resolveram rasgar as páginas do dicionário onde estão escritas as palavras eleitoreira, arriscada e irresponsável.
Porque se fosse mesmo para contar uma história aos netinhos até o apocalipse poderia ser dito sobre Pré-Sal e a perfuração de camadas geológicas até então inacessíveis. Quando as placas tectônicas ficarem revoltadas e começarem a reagir deve ser a iminência do 2012. Nesse caso, a historinha seria bem mais interessante, rica em subsídios para especulações (como todo bom conto), e até mais honesta. Só que parecem pagar bem melhor para contar ficções que rendem eleições.